domingo, 16 de fevereiro de 2014

Morte




"Ah, pra quê chorar
A vida é bela e cruel, despida
Tão desprevenida e exata
Que um dia acaba
Acaba"
Ritual - Cazuza 

Sempre que a morte faz uma visita próxima a mim, eu fico pensativa. É como se ela me dissesse “Oi querida! Estou bem pertinho de você e já-já venho te buscar também. Beijo!”. Fico sempre tão estranha, começo a pensar na minha vida e se ela está valendo a pena. Pra mim, o pior da morte não seria se fosse a minha mas sim a de alguém que amo. Esta semana morreu irmão de uma amiga minha. De cara eu fiquei chocada porque me pus no lugar dela. E se fosse um dos meus irmãos? Eu se quer consegui concluir o pensamento... era uma dor de proporções inimagináveis. No velório vi a dor dos pais, amigos, namorada e me pondo no lugar de cada uma dessas pessoas percebi que a vida é uma piada.
E ai, como fica a agenda de compromissos, as contas pra pagar, as viagens tão sonhadas, as metas do ano? Como pode você estar cheio de vida, de planos, sair pra tomar um açaí e nunca mais voltar? Qual o tamanho da dor de uma mãe que vê se filho se arrumar pra sair de casa, lhe dá um beijo e dizer “Mãe vou sair com os amigos, volto já” e não voltar? Eu não consigo nem imaginar o tamanho da revolta que dá passar a vida toda estudando, se formar numa  faculdade pra no ano seguinte ser assassinado tão covardemente. Pode isso Arnaldo?
É ai que eu começo a pirar: Vale mesmo a pena me afastar de tanta gente pra estudar, me esforçar tanto se tudo pode mudar em um piscar de olhos. Será que minha vida vale menos que minha bolsa, minha carteira? Será que a inveja pode ser superior a minha vontade de viver? Se eu pensar muito nisso jogo tudo por ar, por isso estou escrevendo agora, para aliviar meus pensamentos.
No meio das orações que aconteceram nesse velório eu orei por esse rapaz tão precocemente tirado desse mundo, por seus familiares e amigos e por seus assassinos. Sim, até por eles. Eu penso que eles são os mais perdidos de toda essa história, porque tirar a vida de alguém se motivos aparentes só pode ser coisa de alguém que não tem perspectiva de vida, não sabe o que é amor, não tem família ou amigos. É alguém que não sabe o valor da vida e que pode fazer o mesmo com outras pessoas que, assim como esse rapaz, tenham sonhos e pessoas que as amam. Eu pedi pra Deus olhar por eles e tocasse seus corações para que outras famílias não sofram como aquela que eu estava vendo... com um buraco enorme onde ficava um filho e irmão querido. Como a roda de amigos que perdia um irmão. Como o cachorrinho que perdeu seu dono. Pode parecer ingênuo de minha parte, eu sei mas, por mais que eu não seja religiosa, que não vá a igreja, eu creio em um Deus, O Deus, capaz de tornar o impossível possível, o mal em bem e a dor em paz de espírito. É, Eu creio.
Eu me senti uma intrusa ali por, no fim das contas, eu não era amiga dele, muito menos parente. Mas minha amiga estava (e ainda está) sofrendo então eu estava lá, por ela. Sem contar que a história toda me comoveu então eu não podia não ir, ficar em casa pirando só. Eu fui, para apoiar minha amiga, por que tudo que ela precisava era de força, então fui forte por ela, mas nem conseguir chegar em casa antes das lágrimas descerem. Senti uma dor cortante no peito, um nó gigante na garganta e então me permiti chorar. Chorei como há muito não chorava. Chorei por me imaginar no lugar de todos que estavam ali, inclusive o daquele que não voltou pra casa. Liguei pra uns amigos, para me acalmar um pouco e depois senti uma vontade louca de mudança, que ainda paira por aqui, e que possivelmente vá se concretizar em breve (mudança positiva, garanto).
Desde então sempre que paro reflito e vejo com cada vez mais certeza que a vida é uma grande piada, uma piada mórbida naquelas que ninguém rir no final. Ela permite que você sonhe grande, voe alto e depois te faz despencar, sem a chance de se despedir, de agradecer a todos por tudo. É como se fossemos Icaro, que quis voar, construiu asas de cera e, quando finalmente voou, que viu a cidade lá do alto, teve suas asas derretidas pelo sol e caiu das alturas de seus sonhos. Uma vida derrubada.

À família nada tenho a dizer que possa mudar a nova realidade deles, tudo que posso dizer é que sou solidária à dor e ao sentimento de justiça. Minha amiga, conte comigo... Eu posso te ouvir, sair ou me sentar pra comer brigadeiro à noite toda, é só chamar. Fiquem bem e creiam na justiça Divina. Eu sinto muito, muito mesmo.